Para Luís Valença Pinto, general e antigo chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, Putin colocou-se numa situação particularmente difícil, ao decidir pela invasão agressora da Ucrânia, mas é necessário e urgente encontrar uma solução diplomática para este problema.
"A única coisa que me parece possível e razoável – mas o acordo de Minsk já o consagrou e depois a Rússia abandonou – seria consagrar uma extensa autonomia às regiões de Donetsk e Lugansk e, nesse contexto, respeitar a identidade dos russófonos dessa região. Mas sem quebrar a unidade do Estado ucraniano", disse Valença Pinto, durante uma sessão das conferências Lisbon Speed Talks, dedicada ao tema da Guerra da Ucrânia.
Mas, mesmo perante esta eventual solução, Valença Pinto admite que não vê uma forma fácil de "salvar a face" de Putin, o que considera ser uma variável relevante para o solucionar da crise ucraniana.
"Eu penso que, de alguma forma – mas isto é uma questão delicada – o problema será devolvido aos russos. Aos oligarcas e à população", disse o estratego militar, na conversa desta sessão, onde respondeu às questões da jornalista e diretora da agência Lusa, Luísa Meireles.
Valença Pinto admite que os oligarcas e a população se possam insurgir contra o autoritarismo de Putin, provocando eventualmente uma mudança de regime, resolvendo assim um problema que, de outra forma, se tornou particularmente complexo.
O general começou por dizer que esta invasão agressora da Ucrânia por parte da Rússia foi uma surpresa, porque se acreditava que "a Europa estava a salvo de uma guerra de conquista".
Mas, "até pelo inesperado", esta invasão russa vai provocar uma "transformação significativa na segurança europeia", defendeu Valença Pinto, salientando três aspetos em particular.
"Esta guerra reinventou o Ocidente. Já não sabíamos o que era o Ocidente… (…) Esta guerra revitalizou a Aliança Atlântica. (…) E veio provar que, afinal, a Europa não é um território de consensos impossíveis", argumentou o analista.
Para Valença Pinto, a invasão da Ucrânia veio também acentuar a parceria entre os Estados Unidos e a União Europeia, a que se associou "de forma particularmente rápida" o Reino Unido do primeiro-ministro Boris Johnson.
"A partir de agora, os Estados Unidos vão dar maior atenção à Europa", defendeu Valença Pinto, considerando que esse é um aspeto que deve ter chamado a atenção de um protagonista relevante nesta crise ucraniana: a China.
"Com a sua sabedoria milenar, a China está particularmente atenta ao que se está a passar. E o que a China viu foi uma rápida conjugação de vontades entre os Estados Unidos e a Europa. E viu também o empenho do Reino Unido para essa conjugação de vontades", concluiu o general.
Valença Pinto considera que a questão da adesão da Ucrânia à NATO é um problema à margem da invasão russa, defendendo que Kiev nunca esteve, e continua a não estar, preparada para aderir à Aliança Atlântica, até porque os países vizinhos nunca viram essa hipótese com bons olhos.
"Uma dimensão diferente é a eventualidade da adesão da Ucrânia à União Europeia. Essa, penso que deverá acontecer, talvez até mais cedo do que estava previsto", antevê o general.