Aos jornalistas, no Vaticano, questionado se entrar num conclave é uma coisa perigosa, Tolentino Mendonça declarou: “É tão perigoso como sair dele”.
Já à pergunta sobre se é perigoso “independentemente de como se sai”, o arquivista e bibliotecário do Vaticano desde setembro de 2018, declarou que “o conclave é um momento importante da vida da Igreja”.
“Mas, ali, o importante é convergir, para o espírito de comunhão da Igreja, interpretar os sinais dos tempos e que o Espírito Santo fale. Mas não falemos de conclave. Vida longa ao Papa Francisco”, declarou Tolentino Mendonça que, perante a insistência dos jornalistas, respondeu: “Vida longa ao Papa Francisco e a todos os papas que virão”.
À pergunta se ser feito cardeal implica um risco e se tal o incomoda, o poeta respondeu que “ser cristão é um risco, ser humano é um grande risco”.
“O Guimarães Rosa, esse autor amado da nossa língua, dizia ‘viver é perigoso’. E nós sabemos que é assim. As coisas grandes da vida são assim e todos nós vivemos, nos nossos caminhos diferentes, coisas muito perigosas, um grande amor, um filho, um encontro, um trabalho que nos apaixona”, referiu.
Tolentino Mendonça, de 53 anos, torna-se no sábado no sexto cardeal português deste século e o segundo mais novo no Colégio Cardinalício, que tem por missão aconselhar o Papa.
Natural de Machico, Madeira, o futuro cardeal entrou no seminário aos 11 anos. Doutorado em Teologia Bíblica e antigo vice-reitor da UCP, é um nome essencial da poesia portuguesa contemporânea, tendo já recebido vários prémios.
Aos jornalistas, Tolentino Mendonça reiterou hoje que a nomeação como cardeal foi uma “chamada” que o surpreendeu.
“Foi, para mim, uma chamada e, talvez, pela primeira vez da vida, (…) aceitar uma missão para a qual antes não fui escutado e, por isso, [é com] uma humildade muito grande e um desprendimento no sentido de dizer ‘sou chamado, estou aqui com o que sou’. Venho arregaçar as mangas e servir”, declarou.
Ao ser confrontado com o facto de ter acontecido “tudo rapidamente”, desde que orientou o retiro da Quaresma da Cúria Romana, em 2018, ter assumido o Arquivo e a Biblioteca do Vaticano e agora chegar a cardeal, Tolentino Mendonça apontou a fé.
“Como pessoa de fé eu tenho de olhar para a minha vida, naquilo que acontece, no pequeno e no grande, a partir dessa chave e, de facto, visto de fora parece uma transformação inesperada, súbita, imprevista, mas a partir da fé, vista de dentro, eu tenho de perceber que há aqui alguma coisa que é maior do que eu, que me ultrapassa e me conduz. E nesse sentido, de facto, um dia aos olhos de Deus, são como mil anos”, justificou.
Sobre as perguntas que faz a si próprio nesta ocasião, o futuro cardeal respondeu: “Para mim a pergunta que eu repito no meu coração é neste momento mesmo dirigida a Deus: ‘O que é que queres de mim, o que é que queres que eu faça?”.
“É um momento de encruzilhada, mas ao mesmo tempo Deus tem-me feito falado muito (…) através dos irmãos, dos amigos, das pessoas, dos anónimos que dizem alguma coisa”, comentou.
Segundo o poeta e estudioso da Bíblia, “aí se manifesta de facto o dedo de Deus”.
“E aquilo que peço aos meus amigos, por exemplo, é que puxem por mim, ajudem-me a ser eu próprio, a ser fiel, ajudem-me a servir da melhor maneira”, adiantou, notando que não chega a cardeal sozinho, mas com uma história, na qual se inclui “uma multidão interminável de rostos”.
C/ LUSA